Os recursos financeiros do sócio (pessoa física) de empresa, tais como remuneração, aposentadoria e pensões, podem ser objeto de penhora para pagamento de dívidas trabalhistas?

.               Na atualidade, tem ganhado enfoque o reconhecimento da necessidade de consultoria jurídica adequada em busca da implementação de medidas preventivas e de adequação interna do ambiente empresarial à legislação trabalhista.

.               Objetiva-se com isso a diminuição ou eliminação dos riscos empresariais, com melhor qualidade do ambiente de trabalho, suprimindo, sempre que possível, demandas judiciais e conflitos entre empregado e empregador.

.               Ocorre que, nos casos em que já esteja em trâmite Execução Trabalhista em desfavor da empresa, especificamente, na hipótese de instaurado Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica, previsto nos arts. 133 a 137 do Código de Processo Civil, aplicável ao processo do trabalho nos termos do art. 855-A, da CLT; tem-se que o credor busca atingir o patrimônio do sócio da empresa, redirecionando à pessoa física a responsabilidade para adimplemento da dívida.

.               Uma vez admitido o Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica pelo Juízo da Execução, iniciar-se-ão os atos de constrição de bens e valores do sócio enquanto pessoa física, chegando-se, por exemplo, à ocorrência de bloqueio de valores em contas bancárias de sua titularidade.

.              Acontece que, em muitas casos, tais valores encontrados se tratam de vencimentos, subsídios, salários, remunerações, pensões dentre outros valores de natureza intrinsecamente alimentar e destinadas ao sustento do devedor e de sua família.

.               Atenta a isso, a legislação dispõe, conforme o art. 833, IV, do Código de Processo Civil, a impenhorabilidade destes valores:

Art. 833. São impenhoráveis:

IV – os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º;

2º O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8º, e no art. 529, § 3º.

.             Trazendo a discussão do tema para o Estado de Goiás, o Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO), por meio da Súmula 14, exara a impenhorabilidade de salários e outras espécies semelhantes em valores que não excedam 50 salários-mínimos.

.               Nesse sentido, recentes julgados¹ do Tribunal Trabalhista Goiano tem dado aplicabilidade à previsão do art. 833, IV, CPC e à Súmula 14 do E. TRT18 (GO), que dispõem sobre a impenhorabilidade de salários e outras espécies semelhantes bem como de quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família.

.               Há fundamentos legais e posicionamentos judiciais de que a verba alimentar do sócio executado seria impenhorável em sua totalidade, sendo incabível até mesmo o desconto de percentual parcial:

.               No que se refere aos julgados citados² alhures, imprescindível destacar excerto do entendimento exarado pela Ilustre Relatora Iara Teixeira Rios, ao dispor que a exceção à impenhorabilidade mencionada no §2º do art. 833, CPC, continua sendo relativa somente à obrigação de natureza civil e não trabalhista:

Esclareço que o entendimento desta Relatora é no sentido de que a ‘prestação alimentícia’ (‘independentemente de sua origem’) mencionada no § 2º do art. 833 do CPC continua sendo exceção específica à impenhorabilidade, relativa a obrigação de natureza civil (espécie e não gênero de crédito de natureza alimentícia), não admitindo interpretação ampliativa a ponto de englobar o crédito trabalhista (que, aliás, foi mencionado de forma especificada apenas no § 3º do mesmo dispositivo legal).

.               Do mesmo modo, a OJ nº 153 da SBDI-2 do TST, que fora mantida e atualizada em decorrência do NCPC, dispõe sobre a ilegalidade de penhora sobre valores existentes em conta-salário “ainda que seja limitado a determinado percentual dos valores”.

.               Nesse contexto, consoante fundamentos acima dissertados, em tese, nenhum percentual dos proventos de verba alimentar do sócio (pessoa física) poderia ser objeto de penhora para adimplemento de dívida trabalhista, pois, a redação do §2º do art. 833, CPC, trataria somente das dívidas de natureza civil.

.               Do dever e ônus do executado (sócio) de comprovar a impenhorabilidade:

.               O art. 854, §3º, I, e §4º, do CPC, aduz que incumbe ao executado comprovar que as quantias tornadas indisponíveis são impenhoráveis, de modo que, somente se devidamente demonstrada a natureza alimentar do valor penhorado determinará o juiz o cancelamento de indisponibilidade irregular.

.               Nesse sentido, é necessário que o executado (sócio) apresente ao Juízo da Execução Trabalhista, por meio de defesa técnica adequada, os argumentos e fundamentos pertinentes, acompanhados dos comprovantes de origem dos valores, que sejam aptos a demonstrar a impenhorabilidade da quantia bloqueada judicialmente.

.               Ante o exposto, factível a conclusão do caráter de impenhorabilidade da verba alimentar do sócio, pessoa física, para adimplemento de dívida trabalhista, levando-se em conta, em todas as circunstâncias, a situação do caso concreto.

Larissa Almeida.

  1. (TRT18, MS – 0010302-38.2018.5.18.0000, Rel. IARA TEIXEIRA RIOS, TRIBUNAL PLENO, 10/05/2019) e (TRT18, MSCiv – 0010359-85.2020.5.18.0000, Rel. IARA TEIXEIRA RIOS, OJC de Análise de Recurso, 20/04/2021).
  2. (TRT18, MSCiv – 0010359-85.2020.5.18.0000, Rel. IARA TEIXEIRA RIOS, OJC de Análise de Recurso, 20/04/2021)


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