É POSSÍVEL O RECEBIMENTO DE DÍVIDA ORIUNDA DE CHEQUE PRESCRITO?

.              Em que pese o avanço dos meios de pagamento digitais, a figura do cheque permanece ativa nas relações negociais, sendo considerado título executivo extrajudicial, nos termos no art. 784, I, do Código de Processo Civil, e regulado pela Lei nº. 7.357/85.
.              Ainda, quando se fala em pagamento, independente do meio utilizado, a inadimplência muitas vezes é enfrentada nas transações e, no caso de inadimplência no pagamento de cheque, comumente denominado como “cheque sem fundos”, o credor do título deve observar prazos que interferem na forma, celeridade e efetividade da cobrança.
.              No que se refere ao prazo de apresentação do título à instituição financeira, o art. 33, da Lei nº. 7.357/85, dispõe que o cheque deve ser apresentado para pagamento, a contar do dia da emissão, no prazo de 30 (trinta) dias, quando emitido no lugar onde houver de ser pago; e de 60 (sessenta) dias, quando emitido em outro lugar do País ou no exterior.
.              Expirado o prazo de apresentação do título e comprovada a recusa do pagamento, dá-se início à denominada prescrição cambial, que indica o lapso temporal que o credor possui para exercer o direito à cobrança.
.              Uma vez considerado título executivo pela legislação, tem-se como modalidade mais célere para sua cobrança a Ação de Execução (caput do art. 47, da Lei nº. 7.357/85), caso em que não se discutirá a origem da dívida, partindo-se à citação direta do devedor para pagamento, em 03 (três) dias, conforme art. 829, CPC, e, em caso de inércia, será autorizada, judicialmente, a busca de ativos, bens e recursos financeiros que o devedor disponha e que possam quitar a dívida.
.              Para ajuizar a referida Execução o credor possui 06 (seis) meses contados da data em que expira o prazo de apresentação do cheque para compensação, nos termos do art. 59, da Lei nº. 7.357/85, que dispõe: “Prescrevem em 6 (seis) meses, contados da expiração do prazo de apresentação, a ação que o art. 47 desta Lei assegura ao portador”.
.              Ou seja, se o cheque foi emitido no local onde houver de ser pago, também conhecido pelo termo “mesma praça”, contar-se-ão os 06 (seis) meses a partir dos 30 (trinta) dias definidos para apresentação e, se de praças diferentes, 60 (sessenta) dias, prazo cuja inobservância gera a perda da natureza de título de crédito que se transforma em mero documento de dívida.
.              Desse modo, decorrida a prescrição após 06 (seis) meses contados da expiração do prazo de apresentação, denominado como prazo de prescrição cambial do título, o cheque perde a força executiva.
.              Assim, o credor de cheque prescrito não poderá utilizá-lo para instruir processo de Execução, todavia, a exigibilidade do pagamento ainda existe e poderá ser exercida em até 05 (cinco) anos a contar do dia seguinte à data de emissão da cártula, consoante súmula 503 do STJ e art. 206, § 5º do Código Civil.
.              Nesse sentido, uma das formas do portador do cheque prescrito buscar o recebimento do seu crédito em juízo se dá pela Ação Cambial de Locupletamento Indevido (art. 61 da Lei nº 7.357/85), cujo prazo para ajuizamento é de até 02 (dois) anos a contar da prescrição da Ação Executiva, sendo o cheque suficiente para comprar o fato constitutivo do direito ao recebimento do pagamento, cabendo ao devedor o ônus de eventual desconstituição de prova. (1)
.              Outro meio de cobrança seria a Ação Monitória (art. 700 e seguintes do CPC), em que dispensável a menção ao negócio jurídico subjacente à emissão da cártula (Súmula nº. 531/STJ).
.              Por fim, é possível o ajuizamento de Ação de Cobrança (art. 62 da Lei nº 7.357/85) de natureza causal, hipótese em que é essencial demonstrar o negócio jurídico que deu origem à dívida e embasou a emissão do cheque, isso porque a ação de conhecimento admite maior dilação probatória pela parte devedora bem como a discussão a respeito da origem da dívida e sua legalidade.
.              Nesse contexto, o direito de defesa do suposto devedor é ampliado quando o credor demora a efetivar a cobrança judicial.
.              Ademais, cumpre destacar que valores que não excedam 40 (quarenta) salários-mínimos, constantes dos títulos executivos extrajudiciais, tais como os cheques, podem ser executados até mesmo perante os Juizados Especiais Cíveis (2), nos termos do art. 3º, §1º, II, da Lei nº. 9.099/95, observado o disposto no § 1º do art. 8º do mesmo diploma, com isenção de custas em primeiro grau de jurisdição, tornando a busca pela via judicial ainda mais atrativa e facilitada, não sendo aplicável somente ao trâmite da Ação Monitória, que exige o ajuizamento na Justiça Comum (3).

.              Cuidado com a apresentação antecipada de título pré-datado:
.              Importante alertar que, em que pese tratar-se o cheque de ordem de pagamento à vista (art. 32, da Lei nº. 7.357/85), nos casos em que o título for pré-datado, caracteriza dano moral a sua apresentação antecipada, conforme súmula 370 do Superior Tribunal de Justiça, podendo o credor ser condenado a pagar indenização ao devedor se apresentar o título perante a instituição financeira antes da data convencionada.

.              Considerações finais:
.              Por todo exposto, factível a conclusão sobre a possibilidade de cobrança de dívida oriunda de cheque prescrito, de modo que, se o credor possui um cheque emitido em seu favor, deve consultar um especialista de sua confiança para realizar a análise do título e empregar o meio adequado para cobrança, visto que existem meios efetivos para busca do recebimento da quantia devida, tais como penhora online de ativos financeiros, sejam valores monetários depositados em conta bancária, investimentos, busca de bens móveis, imóveis, veículos de titularidade do devedor dentre outros que são aplicáveis somente pela via judicial.

Larissa Almeida.

(1) Recurso Especial nº 1.269.534/RS (2011/0129336-0), 4ª Turma do STJ, Rel. João Otávio de Noronha. j. 24.07.2015, DJe 17.08.2015
(2 )TJPR – 3ª Turma Recursal – 0013586-68.2015.8.16.0031 – Guarapuava – Rel.: Juíza Giani Maria Moreschi – J. 21.07.2016, Data de Publicação 29.07.2016.
(3) FONAJE, Enunciado 8.



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