O empregado que se recusa a vacinar-se pode ser dispensado por justa causa?

.               Inicialmente é relevante esclarecer que a justa causa, prevista no artigo 482 da CLT, segundo o professor Maurício Godinho Delgado[1] nos ensina que “para o Direito brasileiro, justa causa é o motivo relevante, previsto legalmente, que autoriza a resolução do contrato de trabalho por culpa do sujeito comitente da infração – no caso, o empregado. Trata-se, pois, da conduta tipificada em lei que autoriza a resolução do contrato de trabalho por culpa do trabalhador”.
.               Foi pulicada em fevereiro de 2020 a lei 13.979, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública mundial deflagrada pelo coronavírus. O referido regramento, previu, em seu artigo 3º, inciso III, a possiblidade de realização compulsória de vacinação e outras medidas profiláticas baseadas em evidências científicas.

.               É de conhecimento público e notório que o Coronavírus é uma doença altamente contagiosa, que ensejou uma grave pandemia que vem sendo duramente combatida no mundo todo, e que causou o colapso do sistema de saúde em geral (escassez de vagas, elevação no número de internações hospitalares, falta de leitos de UTI, necessidade de compra de respiradores, oxigênio, medicamentos, contratação de profissionais de saúde) e ocasionou um aumento expressivo do número de óbitos. Vale salientar os incontáveis prejuízos para a economia global, incluindo, o fechamento de estabelecimentos comerciais, empresas e até a diminuição expressiva de postos de trabalho.

.               Importante destacar que o C. STF já se manifestou no sentido de que a vacinação obrigatória se afigura como conduta legítima, desde que as medidas preventivas observem os critérios constantes sobre o direito à informação, ao tratamento gratuito, entre outros. Ainda, a Constituição assegura a proteção aos direitos dos trabalhadores, dentre eles as suas concepções morais, espirituais e pessoais, de forma que o interesse coletivo supera as predileções individuais, ainda mais em se tratando de uma medida que tem o intuito de erradicar a doença.

.               Em razão do cenário que já passamos e ainda estamos enfrentando a eventual recusa do trabalhador em tomar a vacina, e, portanto, apta a ensejar a justa causa, relaciona-se àquela feita de forma injustificada. De lado contrário, comportando justo motivo, ou seja, quando o trabalhador tenha problemas de saúde que poderão ser agravados ou causar riscos à vida após a aplicação da vacina, entende-se que o caso demandaria atenção e cuidados especiais, sobretudo para se evitar qualquer tipo de arbitrariedade ou abuso de direito.

.               A Consolidação das Leis do Trabalho preceitua que compete as empresas cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho, devendo adotar as medidas cabíveis. De igual modo, cabe ao empregado colaborar para que sejam efetivamente aplicadas as normas de segurança e medicina do trabalho. Desse modo, compete a todos empregar esforços para a proteção do meio ambiente laboral.

.               Com esse entendimento o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região manteve a dispensa por justa causa de uma funcionária de hospital que se negou a tomar vacina. No caso, uma auxiliar de limpeza que prestava serviços em um hospital não compareceu no dia marcado para vacinação contra a Covid-19 e foi demitida por justa causa. A mulher alegou que a recusa em se vacinar não pode ser considerada ato de indisciplina ou insubordinação. Ela entrou com ação trabalhista, pedindo a conversão para dispensa injusta e o pagamento de verbas rescisórias.

.               A juíza da 2ª Vara do Trabalho de São Caetano do Sul (SP) julgou improcedente o pedido da autora, pois a necessidade de proteção da saúde de todos os trabalhadores e pacientes do hospital deve se sobrepor ao direito individual de se abster da imunização. A autora recorreu ao TRT-2. Em grau recursal restou decidido que como a funcionária não apresentou nenhum motivo para a recusa de se vacinar, a demissão por justa causa não foi abusiva ou descabida, mas sim legítima e regular, veja a íntegra da decisão nos autos 1000122-24.2021.5.02.0472.

.               O julgamento deixa claro que a tendência a ser seguida pelos Tribunais do Trabalho, é no sentido de que nenhuma posição particular, convicção religiosa, filosófica, política ou temor subjetivo do empregado pode prevalecer sobre o direito da coletividade de obter a imunização conferida pela vacina, prevista em programa nacional de vacinação.

.               Deste modo, dentre outras medidas de proteção e de saúde pública, a vacinação se mostra como um dos meios seguros e eficazes de controle a pandemia. Vale dizer que neste momento todos devem tentar agir com razoabilidade para que a vida seja protegida e, nesse sentido, a priorização da proteção da saúde da coletividade prevalece ao direito individual.

.               Sem polemizar, se porventura, o empregado não possuir uma justificativa plausível para a recusa em tomar a vacina e considerando o dever do empregador em proteger o meio ambiente laboral, pode-se entender perfeitamente crível este se valer do seu poder diretivo para, neste caso, proceder com a dispensa do trabalhador por justa causa, dada a gravidade da situação enfrentada.

https://www.conjur.com.br/dl/1000122-2420215020472.pdf

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm

https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-13.979-de-6-de-fevereiro-de-2020-242078735

https://www.cnnbrasil.com.br/business/empresa-pode-demitir-quem-nao-se-vacinar-contra-a-covid-19-diz-advogado/

[1]https://www.conjur.com.br/2021-jul-01/pratica-trabalhista-recusa-empregado-tomar-vacina-possibilidade-dispensa-justa-causa



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